Memórias de Sri Daya Mata 1, discípula de Paramahansa Yogananda

(As seguintes histórias foram extraídas de palestras de Sri Daya Mata, publicadas em suas antologias, Only Love e Finding the Joy Within You, como também na revista Self Realization.)

Amanhã começam as aulas,* e lembro-me da ocasião, em Salt Lake City, há muitos anos, quando, pela primeira vez, assisti às aulas de nosso venerado guru Paramahansa Yogananda. Que impacto formidável ele causou em minha vida!
Desde a mais tenra infância, eu sentira o incessante desejo de encontrar Deus nesta vida. Foi aos dezessete anos que encontrei Paramahansaji. Meu corpo estava muito doente naquela época. Eu sofria de intoxicação sangüínea por todo o organismo, e os médicos não conseguiam encontrar a cura. Um de meus olhos estava sempre fechado, de tão inchado, e eu andava com três ataduras em volta do rosto.
As ataduras foram, na verdade, uma bênção, pois eu chamava muito a atenção, mesmo no meio de público tão numeroso! Naquela época, o Mestre realizava várias palestras, apresentando seus ensinamentos antes das aulas, nas quais tratava dos aspectos mais profundos e métodos da ioga. Depois da última palestra pública, convidava a platéia para ir até onde ele estava, e cumprimentava individualmente a todos. Aproximei-me dele com as pernas tremendo; eu era muitíssimo tímida. Quando fiquei à sua frente, ele olhou para meu rosto desfigurado e perguntou:
– O que houve com você? – Depois que minha mãe, com quem eu tinha ido às palestras, explicou meu problema de saúde, ele disse: – Venha amanhã para as aulas – (é claro que eu planejava ir, de qualquer modo!) – mas não vá embora, quando terminarem.
Passei o dia seguinte em ansioso estado de antecipação, pois novamente conversaria com o Guru. Naquela noite, ele falou a respeito da fé e do poder da vontade. Aquilo inspirou-me de tal maneira que, enquanto o escutava, senti que era certamente possível mover montanhas com a fé em Deus.
Após a reunião, esperei para ser a última a cumprimentá-lo. Durante a conversa, sem mais nem menos, ele perguntou de repente:
– Você acredita que Deus pode curá-la? – Quando disse isso, seus olhos se iluminaram com poder divino. Respondi:
– Eu sei que Deus pode curar-me. Em gesto de bênção, ele me tocou entre as sobrancelhas, no que chamamos de centro crístico, ou Kutastha (a sede do olho espiritual que tudo percebe). Então disse:
– De hoje em diante, você está curada. Daqui a uma semana, não precisará mais das ataduras; as chagas terão desaparecido. – E foi exatamente o que aconteceu.
Em uma semana os sintomas desapareceram, e nunca mais voltaram.
Quando eu era uma jovem devota no caminho, fui pedir um conselho a Guruji:
“Mestre, não gosto das imperfeições que vejo em mim mesma. Ajude-me; mostre-me o modo para me libertar de meus defeitos.” Naqueles dias, um problema que me doía era o sentimento de que não tinha suficiente fé. Assim, perguntei a Paramahansaji:
“Como posso desenvolver uma fé mais forte?”
A resposta dele: “Você só precisa trabalhar para isso”. Tão simples! E eu esperava que ele me abençoasse com alguma técnica nova ou com a graça divina, por meio das quais eu teria uma fé instantânea. Não. “Você tem que praticá-la”, ele disse. Apenas pela prática podemos adquirir qualquer qualidade desejada: fé, autocontrole, generosidade, compaixão, amor.
Então comecei. E quanto mais eu cultivava a fé, assim me ajudando, tanto mais parecia que as coisas conspiravam para abalar minha fé!
Eu não parecia estar chegando a lugar algum. Finalmente, comecei a perceber que havia algo errado em minha atitude. Depois de pensar nisso, compreendi:
“Bem, já sei o que é. Eu não estou levando este problema para Deus.”
Daí em diante, quando me sentava diante do pequeno altar em meu quarto, eu rezava: “Mãe Divina, se Tu és minha Mãe, se Tu és o meu Deus, tens que me ajudar. Eu não pedi para estar com tantas dúvidas. Por que deveria esta fraqueza me causar tanta dificuldade?
Sei que minha alma está repleta de fé, e de amor, força, sabedoria, todas esses qualidades que fluem de Tua natureza divina, pois sou feita à Tua imagem.
Por que não posso sentir fé? Estou impotente sem Ti.” Gradualmente, comecei a ver quão perto do devoto está o Amado Divino, quão disposto para responder.
Quando conheci nosso Guru, em Salt Lake City, e ele nos contou a respeito de seu ashram em Los Angeles, meu coração e minha mente arderam com o desejo de vir para cá: “Poderei me dedicar completamente à meditação e ficar inebriada do amor de Deus; e, algum dia, também verei a Deus, face a face, tal qual Jesus e todos os grandes santos.” Quando, porém, cheguei a Mt. Washington e notei que todos recebiam muitas tarefas – limpar a cozinha, preparar as comidas, lavar pratos, varrer as calçadas, trabalhar no escritório ou no jardim, e assim por diante – pensei comigo: “Mas não é isso que eu imaginava!”
Minha atitude logo mudou completamente. O anseio de amar a Deus desde aqueles primeiros dias nunca diminuiu; e sei que eu jamais poderia me satisfazer com apenas sentir Deus na solidão, afastada das atividades de serviço a Ele e a Seu trabalho. Eu não seria uma pessoa completa: capaz de sentir o amor da Mãe Divina dentro de mim quando fecho os olhos em meditação, e capaz de sentir a presença Dela, na mesma intensidade, quando estou ocupada servindo e executando meus deveres. Esse é o estado de um verdadeiro iogue.
Não importa o que ele faz, não importa onde ele está, sua mente está absorta em Deus. É o que Deus quer que nós aprendamos neste mundo. E nós podemos aprender!
Lembro-me de uma vez em que um grupo de discípulos estava sentado perto de Guruji, falando sobre questões espirituais. De repente, ele olhou para cada um de nós e começou a sorrir.
Perguntamos: “O que é, Mestre?” Ele balançou a cabeça e respondeu: “Eu não atraí gente pusilânime. Todos vocês são pessoas de vontade forte.” E acrescentou: “Sempre que tiverem dificuldades, reúnam-se e conversem sobre o assunto”. O Mestre também dizia: “Os tolos discutem; os sábios debatem”. Ninguém aqui gosta de ser considerado tolo, então todos nos sentamos e debatemos, como sábios.
Muitos anos atrás, eu estava sentada nesta própria capela, e Gurudeva estava falando a alguns de nós devotos sobre essas mesmas coisas: que precisamos saber que Deus está conosco, que Ele está logo atrás de nossos olhos fechados quando oramos. Eu estava escutando Guruji com um entusiasmo tão profundo, com uma crença tão completa em suas palavras. De repente, enquanto ele falava, contemplei a capela inteira desaparecer em nada mais que a pura Luz Divina, a Vibração Divina. Lembro-me que pensei: “Isto é o que significa perceber que tudo
neste universo é a manifestação de um só pensamento, de uma só inteligência, de uma só vibração, de um só poder: Deus.”
Na última semana de fevereiro de 1952, Guruji recebeu, no deserto, o recado de que fora convidado para falar em Los Angeles, numa recepção para o embaixador da Índia, Sri Binay Ranjan Sen. Gurudeva retornou à nossa sede central de Los Angeles em 1o de março. No dia 3 de março, sob a direção de Guruji, passamos muitas horas preparando doces especiais e molhos de caril para o embaixador, que seria hóspede da sede central da Self-Realization Fellowship no dia seguinte.
Em 6 de março, a noite que antecedeu a seu mahasamadhi, eu estava caminhando pelo corredor, junto com o abençoado Mestre. Ele se deteve, sentou-se diante da pintura de seu guru Swami Sri Yukteswarji, e falou com muito amor dessa grande alma que guiara seus passos para Deus.
Então Gurudeva me disse: “Você se dá conta de que é apenas uma questão de horas, e eu terei deixado este corpo?”
Uma grande dor de tristeza transpassou meu coração. Não fazia muito tempo, quando Gurudeva havia falado que deixaria o corpo logo, eu lhe dissera: “Mestre, que faremos sem o senhor? O senhor é o diamante no anel de nossos corações e de sua organização. Qual o valor do anel sem a beleza do diamante?”
Então veio a resposta desse grande bhakta (amante de Deus): “Lembre-se disto: Quando eu me for, só o amor poderá me substituir. Absorva-se noite e dia no amor de Deus, e dê esse amor para todos.”

* Referência às aulas da Convenção da Self-Realization Fellowship.

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